Literatura Infantil (1880-1910)
10. O mentiroso
Podia jurar! Riam-se dele. Mentia tanto, que ninguém dava crédito ao que dizia. Às vezes queixava-se de moléstias: e, longe de o tratarem carinhosamente, repreendiam-no, ameaçavam-no, quando não lhe dobravam os exercícios de escrita; e, pobrezinho! Muitas e muitas noites, ardendo em febre, debruçado á carteira, copiava compridas descrições, — e tudo porque mentia. Os mesmos companheiros repeliam-no quando ele aparecia contando um fato:
— Ora, sai daqui, mentiroso! Pensas, então, que somo tolos?
Uma manhã desceu ao rio em companhia de outro Chovera abundantemente dias antes, e o rio assoberbado, transbordara.
Os dois meninos hesitaram algum tempo antes de tirar as roupas; o mais velho, porém, nadador intrépido, acoroçoou André, o mentiroso:
— Vamos, a correnteza é insignificante e não precisamos ir para o meio do rio. Vamos!
Animado, André atirou-se ao rio; a correnteza, porém, começou a arrastá-lo, de sorte que, quando ele quis tomar pé, a água cobriu-lhe a cabeça. O outro boiava cantarolando.
De repente ouviu um grito angustiado: — Ai! — Voltou-se,e, não vendo André, teve um sobressalto; logo, porém, considerando, sorriu: — Pois sim! Pensas que me enganas! — E continuou a nadar tranqüilamente. Mas André não aparecia: o menino ganhou a margem, lançou os olhos para os cantos, desconfiando de que o companheiro se houvesse escondido em alguma moita para assustá-lo; vendo, porém, que não aparecia, correu aterrado para o colégio, levando a tristíssima notícia. Desceram criados, e, atirando-se ao rio, procuraram o pequeno que as águas haviam arrebatado. E o companheiro, em pranto, repetia com sentimento:
— Eu bem ouvi o seu grito, bem ouvi, mas ele mentia tanto...
Dias depois, apareceu coberto de ervas e horrivelmente deformado o cadáver do pequeno André; e o companheiro, vendo-o, soluçou ainda: — Coitado! Mas foi por culpa dele. Mentia tanto!