Línguas e Instrumentos Lingüísticos n° 9/10


APRESENTAÇÃO

DINÂMICA DA RELAÇÃO “TURCOS-SULTÃO” NOS SÉCULOS XVII-XVIII E EFEITOS DE SENTIDO: PODE-SE FALAR DE ACONTECIMENTO SEMÂNTICO?
Rachele Raus

SENTIDO E ACONTECIMENTO: SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO DIÁLOGO.
Mariângela P. Galli Joanilho

DO DISCURSO SOBRE O TUPI PARA O DISCURSO DOS TUPI: PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO E IMAGINÁRIO.
Maria Aparecida Honório-Ceci

A LÍNGUA VERNÁCULA NA VISÃO DE REDATORES BAIANOS 1920 -1921.
Zenaide de Oliveira Novais Carneiro

O (QUASE) ESQUECIMENTO DOS AFRICANISMOS EM ESTUDOS DE PACHECO SILVA E SAID ALI.
Norma Lucia Fernandes de Almeida


CRÔNICAS E CONTROVÉRSIAS
ACERVO DO POETA FELIPPE D’ OLIVEIRA: O TESTEMUNHO DAS CARTAS.
Pedro Brum Santos

IX INTERNATIONAL CONFERENCE ON THE HISTORY OF LANGUAGE SCIENCES.

RESENHAS

LÍNGUA E CONHECIMENTO LINGÜÍSTICO: PARA UMA HISTÓRIA DAS IDÉIAS NO BRASIL.
Eni P. Orlandi

PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO CONHECIMENTO: ESTADO, MÍDIA, SOCIEDADE.



APRESENTAÇÃO

    Este volume da Revista Línguas e Instrumentos Lingüísticas tem dois núcleos de interesse. No primeiro, encontramos três textos que trazem análises de aspectos da significação, através da análise da designação e da metáfora, e da mobilização de conceitos como interdiscurso e acontecimento.
    Rachele Raus analisa a mudança de sentido na relação turcos- Sultão tal como representada pelos franceses entre os séculos XVII e XVIII. O fato de que as mudanças ocorridas entre os dois séculos correspondam a mudanças efetivas no Império otomano leva a autora a supor que a re-elaboração do referente 'turcos-Sultão' pelos franceses não seja indiferente à proximidade da Revolução Francesa, e ela constitua, pelos efeitos lexicais e discursivos que carrega, acontecimento semântico.
    Mariângela Joanilho apresenta uma discussão da metáfora a partir da análise do acontecimento enunciativo da inscrição da palavra “diálogo" no cassetete de um policial destacado para vigiar uma manisfestação de camelôs em São Paulo, em 1999. A autora mostra a forma dissensual de funcionamento da metáfora, enquanto lugar de subjetividade.
    Maria Aparecida Honório analisa os discursos sobre as línguas faladas Brasil no início da colonização e seus efeitos na atual conjuntura da educação escolar indígena. Observando o funcionamento das designações, mostra o modo de produção interdiscursivo de sentidos sobre a diversidade lingüístico-cultural no país. Tendo em vista a problemática do ensino em comunidades indígenas em que o português é a única língua falada, o texto quer contribuir na tomada de uma posição crítica e conseqüente acerca do ensino de línguas em contexto indígena.
    No segundo núcleo de interesse, estão dois textos que tratam de aspectos da história das Idéias Lingüísticas no Brasil.
    Zenaide Carneiro analisa trechos de três colunas sobre a língua publicadas em jornais da Bahia na década de 1920. O eixo é a coluna de Galdino Moreira (Galmor), de quem a autora mostra o posicionamento (contra o purismo e a favor das especificidades do português brasileiro) uma contenda própria à sua época: entre puristas e defensores da especificidade da língua portuguesa do Brasil.
    Norma de Almeida analisa obras de dois autores que marcaram os estudos lingüísticos no Brasil entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX: Pacheco Silva e Said Ali. O objetivo é compreender como estes autores enunciaram os elementos de origem africana do português do Brasil, chamados africanismos, em relação à língua nacional do Brasil.
    Na seção Crônicas e Controvérsias está um texto, de Pedro Brum Santos, também sobre a História das Idéias no Brasil, cujo objetivo é levantar, inventariar e analisar textos-fonte para o estudo da literatura e da cultura do Rio Grande do Sul. Mais especificamente, tem como objeto um conjunto de cartas pertencentes ao acervo do poeta Felippe D'Oliveira (1890-1933), que se encontra em Santa Maria, terra natal do autor.
    Ao lado deste trabalho, e em virtude da importância do evento dedicada a um dos assuntos que compõem a linha editorial de Línguas e Instrumentos Lingüísticos, publicamos uma pequena nota a respeito da IX International Conference on the History of Language Science, que se realizou no Brasil em agosto de 2002, por iniciativa dos departamentos de Lingüística da Unicamp e da USP.
    A seção Resenhas traz a leitura de duas obras. Sheila Elias de Oliveira analisa o livro Língua e Conhecimento Lingüístico de Eni P. Orlandi, obra que "tem o mérito de nos interrogar sobre nossas próprias práticas enunciativas como sujeitos falantes e, de maneira bem específica, como estudiosos da linguagem e professores de lingua/lingüística".
    Rosane de Bastos apresenta Produção e Circulação do Conhecimento: Estado, Mídia, Sociedade, Volume I, obra que analisa aspectos importantes da relação entre a ciência, a mídia, a sociedade e Estado.
    Com este volume Línguas e Instrumentos Lingüísticos chega a seu décimo número. Os volumes publicados nestes cinco anos (1998-2002: têm procurado, tal como este, contribuir para a circulação do conhecimento sobre Linguagem e assim criar possibilidades reais de discussão de questões relevantes da área dos Estudos Lingüísticos, aí incluída a História das teorias, dos métodos e das Idéias Lingüísticas.
     
Os Editores



DINÂMICA DA RELAÇÃO “TURCOS-SULTÃO” NOS SÉCULOS XVII-XVIII E EFEITOS DE SENTIDO: PODE-SE FALAR DE ACONTECIMENTO SEMÂNTICO?

Rachele Raus
UNIVERSITÉ DE PARIS III

RESUMO: Em um corpus de verbetes de dicionário, textos literários e de viagem, Rachele Raus analisa a mudança de sentido na relação 'turcos-Sultão’ tal como representada pelos franceses entre os séculos XVII e XVIII. A autora interpreta elementos como: a diminuição dos  textos de viagem no século XVIII; o papel de deus impingido ao sultão no século XVII e o de tirano na segunda metade do século XVIII; a sensualidade atribuída ao sultão no século XVII e estendida aos turcos no século XVIII; a representação do harém relacionada à falta de liberdade das mulheres devido ao despotismo (religioso) século XVIII; a passagem do silêncio dos turcos no século XVII à I revolta no século XVIII. O fato de que as mudanças ocorridas entre os dois séculos não correspondem a mudanças efetivas no Império otomano levam a autora a supor que a re-elaboração do referente 'turcos-Sultão' pelos franceses não seja indiferente à proximidade da Revolução Francesa, e que ela constitua, pelos efeitos lexicais e discursivos que carrega, um acontecimento semântico.

ASTRACT: In a corpus composed of dictionary entries, literary ts and voyage diaries, Rachele Raus analyses the change of sense 'he relation Turks-sultan as it is represented by the French between 17th and 18th centuries. The author interprets elements such as: reduction of voyage diaries in the 18th century; the role of god attributed to the sultan in the 17th century and that of a tyrant in the second half of the 18th century; the sensuality attributed to the sultan in the 17th century and extended to the Turks in the 18th century; representation of the harem related to the lack of liberty of women to (religious) despotism in the 18th century; the passage of a Turkish silence in the 17dt century to a Turkish rebellion in the 18dt century. The fact that the changes between the two centuries do not correspond effective changes in the Ottoman Empire leads the author to assume that the re-elaboration of the referent 'Turks-sultan' by the French is not indifferent to the approach of the French Revolution 1d that it constitutes, for the lexical and discursive effects that it brings with it, a semantic event.



SENTIDO E ACONTECIMENTO: SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO DIÁLOGO.

Mariângela P. Galli Joanilho
UNIVERSDADE ESTADUAL DE LONDRINA -PR

RESUMO: Mariângela Joanilho apresenta uma discussão da metáfora com base em teóricos que consideram o político como próprio das práticas de linguagem: Michel Pêcheux, Eni Orlandi, ,Jacques Ranciere, Eduardo Guimarães. A partir da análise do acontecimento enunciativo da inscrição da palavra "diálogo" cassetete de um policial destacado para vigiar um protesto de camelôs em São Paulo em 1999, a autora mostra a forma dissensual de funcionamento da metáfora, enquanto lugar de subietividade.

ABSTRACT: Mariângela Joanilho presents a discussion of metaphor based on theoreticians who consider lhe poli ti cal character as proper to language practices: Michel Pêcheux, Eni Orlandi, Jacques Racière, Eduardo Guimarães. Starting from the analysis of the speech event of the inscription of the word "dialogue" on the blackjack of a policeman picked out to watch over a protest of “camelôs" in São Paulo in 1999, the author shows the disensual form of the functioning of metaphor as a place of subjectivity.

topo


DO DISCURSO SOBRE O TUPI PARA O DISCURSO DOS TUPI: PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO E IMAGINÁRIO.

Maria Aparecida Honório-Ceci
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ -PR

RESUMO: Focalizando a questão da diversidade lingüística brasileira, este trabalho tem como objetivo analisar os discursos sobre as línguas faladas no Brasil no início da colonização e seus efeitos na atual conjuntura da educação escolar indígena.Procuramos comparar os modos de produção de sentido sobre as línguas e os sujeitos falantes no texto Viagem ao Brasil, de Hans Staden (1557), e em alguns textos orais produzidos pelos Tupinikim na atualidade. Pelas análises, mostramos de que modo a construção ma unidade imaginária de língua e de sujeito indígena no período colonial retorna nos dizeres atuais sob forma de ressonância discursiva, afetando as práticas sociais e os processos identitários sociedades indígenas. Observando o funcionamento das designações, mostramos ainda o modo de produção interdiscursivo de sentidos sobre a diversidade lingüístico-cultural no país. Tendo em vista a problemática do ensino de tupi em comunidades indígenas em que o português é a única língua falada, este texto quer contribuir na tomada de uma posição crítica e conseqüente acerca do ensino línguas em contexto indígena.

ABSTRACT: Focusing on the question of Brazilian linguistic diversity, this paper aims at analyzing the discourses about languages en in Brazil in the beginning of our colonization and their effects on the present situation of Indian education. We have searched to compare the means of producing meaning about such languages their speakers in the text Voyage to Brazil, by Hans Staden (1557), in some oral texts by the Tupinikim nowadays. Through the analyses we have shown in which ways the construction of an imaginary of the language and the Indian subject in the colonial period returns in present speeches as a discursive resonance, affecting social practices as well as identitary processes in Indian societies. Observing the functioning of several designations, we have a shown the inter-discursive means of production of meaning about the linguistic-cultural diversity in the country. In face of the problem of the teaching of tupi in Indian communities in which Portuguese is the only language spoken, this text wishes to contribute to a critical and consequent positioning regarding language teaching in Indian context.



A LÍNGUA VERNÁCULA NA VISÃO DE REDATORES BAIANOS 1920 -1921.

Zenaide de Oliveira Novais Carneiro

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA -BA

RESUMO: Neste texto, Zenaide Carneiro analisa trechos de três colunas sobre a língua,publicadas em jornais da Bahia na década de 1920. O eixo é a coluna de Galdino Moreira (Galmor), do qual a autora mostra o posicionamento em uma contenda própria à sua época: entre puristas e defensores da especificidade da língua portuguesa do Brasil. A análise mostra como Galmor se afirma o purismo e a favor das especificidades do português brasileiro em traços como: o acolhimento de expressões consideradas "estrangeirismos"; o enunciar do lugar de leigo, indo o seu dizer como "opinião" e colocando-se, então, como um do povo; o respaldo da fala do povo pela fala de literatos; as ações do português do Brasil -assumido por Galmor como “nosso”- em contraponto às do português de Portugal.

ABSTRACT: In this article, Zenaide Carneiro analyzes excerpts from three columns about language published in newspapers of in the decade of 1920. The axis is the column of Galdino Moreira (Galmor) of whom the author shoes his positioning in a ~ current at his time: that between purists and defenders of the specificity of Portuguese in Brazil. The analysis shows how or takes position against purism and favorable to specificities in Brazilian Portuguese in traces such as: his action of expressions considered to be "foreignisms "; his enunciation as a layman, stating his speech as an "opinion" and ,putting himself as one of the people; the corroboration of the speech of the people through the speech of literates; the designations of Brazilian Portuguese -assumed by Galmor as ., -contra-posed to European Portuguese.

topo



O (QUASE) ESQUECIMENTO DOS AFRICANISMOS EM ESTUDOS DE PACHECO SILVA E SAID ALI.

Norma Lucia Fernandes de Almeida
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA

RESUMO: Norma de Almeida analisa obras de dois autores que marcaram os estudos lingüísticos no Brasil entre o final do século XIX a primeira metade do século XX. Pacheco Silva e Said Ali. O objetivo é compreender como estes autores enunciaram os elementos de origem africana do português americano, chamados africanismos, em relação à língua nacional do Brasil. As análises mostram que mesmo neste momento em que se valorizam as especificidades do nosso português, os africanismos são freqüentemente negligenciados, em contraponto aos indigenismos, enunciados como "brasileirismos".  Quando incluídos, os africanismos são palavras com valor pejorativo;além disso, seu uso é desaconselhado no português culto. Na divisão que constitui a língua portuguesa no Brasil, o modo de enunciação dos africanismos orienta para uma imagem de língua nacional europeizada, considerada culta.

ABSTRACT: Norma de Almeida analyzes works of two important authors in linguistic studies in Brazil between the end of the 19th and the beginning of the 20th century: Pacheco Silva e Said Ali. The aim is to understand how these authors have enunciated the elements of African origin in American Portuguese, called africanisms, in relation to the national language in Brazil. The analyses show that even in this moment in which specificities of our Portuguese are valued, africanisms are frequently neglected, differently to what happens to indianisms, enunciated as "brazilianisms ". When included, africanisms are words pejorative value; besides, their use is de-counseled in cultivated Portuguese. In the division that constitutes Portuguese language in Brazil, the means of enunciation of africanisms leads to an image of an European-like national language, regarded as cultivated.



| inicial | créditos | links | contato | mapa do site |