Literatura Infantil (1880-1910)

XXVIII. AS LAVADEIRAS

Dentro em pouco, as cinco mulheres e os três rapazes formavam um só grupo.

A velha, a que gracejara com Alfredo, tomou o peixe e escamou-o em dois tempos, com grande admiração do pequeno que nunca a supusera capaz de fazer aquilo tão depressa. Depois, a lavadeira acendeu fogo, arranjou um espeto, e enfiou o peixe, temperado com um pouco de sal, levando-o às brasas.

¾ Maria! ¾ exclamou ela a uma rapariga, que, pela idade e pelas feições, parecia ser sua filha ¾ vai molhando essa roupa!

E, voltando-se para Carlos, perguntou:

¾ Aquelas roupinhas estendidas ali são de vocês?

¾ São.

¾ Estão corando?

¾ Creio que sim, ¾ respondeu ele, com um ar de quem não entendia muito daquilo.

¾ Pois, vou mandar enxugá-las...

E, depois de alguns momentos:

¾ Vocês de onde são, e que estão fazendo aqui?

Carlos não achou conveniente estar contando sua história a toda gente; e fazendo um sinal a Alfredo, para lhe indicar que não falasse, deu tempo a Juvêncio, que respondeu:

¾ Somos de Petrolina, e vamos até Vila Nova, e talvez mesmo até a Baía; estes meninos têm família na Baía, uns parentes do pai, e querem ver se conseguem entrar em um colégio; e eu quero ver se arranjo um emprego.

Um grande açude, na região do Nordeste, perseguida pelas secas.

Assado o peixe, a velha entregou-o a Carlos que o não queria aceitar. Ela, porém, insistiu:

¾ Aceite! Nós todas já almoçamos bem. Ah! Mas vocês não têm farinha... Oh! Maria! ¾ gritou, voltando-se para a filha. ¾ Vai à casa buscar um pouco de farinha.

¾ Não, não é preciso! ¾ acudiram os três rapazes.

¾ Vai, já te disse! É ali! ¾ continuou, apontando uma casa que se via bem distinta, na encosta, defronte do ponto em que estavam.

Partiu a rapariga, e, dez minutos depois, estava de volta, com uma cuia de farinha. Mas, ao mesmo tempo que ela descia, por um lado, descia, pelo outro, o dono da venda, que, mal chegou à distância de ser ouvido, gritou:

¾ Olá! Rapaz! Que estás fazendo aí! ¾ perguntou o vendeiro ao Juvêncio.

¾ Lavando umas roupas, e apanhando umas piabanhas, enquanto as roupas coram ao sol...

¾ Mas os teus companheiros não podem fazer isso sem o teu auxílio?

¾ Podem... Porque pergunta?

¾ Porque preciso de alguém que me leve já uma carta aqui adiante, ao arraial do Riachinho, no caminho de Vila Nova, e bem me podias prestar esse serviço, ganhando alguma cousa.

¾ A carta tem resposta?

¾ Não.

Juvêncio piscou um olho para Carlos, e respondeu ao vendeiro:

¾ Não há dúvida. Prepare a sua carta, que irei levá-la agora mesmo. E fique descansando que não há de queixar-se do portador!

Assim que o homem se afastou, o rapaz disse aos companheiros:

¾ Um negócio magnífico, hem?

¾ Por quê? ¾ interrogou Carlos.

¾ Por que teremos de passar inevitavelmente por esse arraial, e, assim, aproveito a ocasião para ganhar algum dinheiro.

¾ Mas ¾ objetou Carlos ¾ o homem diz que a carta deve seguir já, e nós não podemos partir daqui sem que as nossas roupas tenham secado...

¾ Isso é o menos. Vosmecês ficam aqui. Eu sigo hoje, e dou conta do meu recado. Amanhã, quando tudo estiver pronto, vosmecês partem bem cedo, vão seguindo sempre o mesmo caminho direito, e encontram-se comigo em Riachinho.

¾ E com que roupa vai você?

¾ Vou com esta camisa velha, com esta calça molhada, que há de secar com o sol, e com o paletó de Carlos. Vosmecês levam o resto da minha roupa.

¾ Bem! Mas como havemos nós de achá-lo lá no arraial?

¾ Ora! Um arraial não é uma cidade; não é o Recife, nem o Rio de Janeiro... Olhe: deve haver lá uma igreja, uma capela...

¾ Há, sim, ¾ acudiu a velha, que o escutara.

¾ Muito bem! Amanhã, do meio dia para a tarde, ficarei à porta da igreja à espera de vosmecês.

¾ Eles só não irão, ¾ interveio rindo a velha, ¾ se eu os prender lá em casa; ¾ e apontou para a casinha. ¾ E estou com muita vontade de fazer isto: quero guardar este vadio ¾ e levou a mão aos cabelos de Alfredo ¾ para o casar com uma velha que me criou...

Apareceu de novo o vendeiro, e entregou a carta ao Juvêncio. Os rapazes abraçaram-se, e Juvêncio, ao ver os outros comovidos, disse gracejando:

¾ Que é isto? A separação é tão curta! Eu não vou para um país estrangeiro...

Juvêncio ainda cumprimentou com a cabeça as mulheres, apertou a mão às duas que estavam no grupo, mãe e filha, e partiu.