Remix

Remix

A palavra “remix” é comumente associada às produções nas quais é possível perceber a presença de outra obra pré-existente. Dessa forma, muitas vezes confunde-se as produções com o processo de remixar, dando o nome a outras práticas, como collage, détournement, bricolagem, pastiche, jamming cultural, sampling, cortar e colar, found footage, Merz pictures, readymades, cut-ups, recombinant art, versão, bootlegs, bastard pop e até o mashup.

Segundo Navas (2012), para além das produções (e discursos), também podemos falar do remix enquanto técnica e enquanto cultura. Dessa forma, o autor define as produções de remix como aquelas que usam da técnica de remixar (copiar/recortar e colar) e se materializam dentro de um ethos específico.

Para produzir uma peça remixada, é preciso mais do que apenas dominar tal técnica, é preciso selecionar samples (amostras)  da obra original que contribuam para a construção de sentido pretendido, sendo necessária uma certa .

Assim, o remix, enquanto enunciado, nada mais é do que uma obra na qual é possível reconhecer a “aura espetacular” (NAVAS, 2012) da obra original que foi remixada. Essa aura pode ser reconhecida em obras que passam por diversos processos/métodos criativos (NAVAS. 2012; BUZATO et al., 2013) típicos da cultura remix. Tais criações são classificadas como artefatos técnico-científicosTais produtos se dividem em categorias e subcategorias de acordo com as técnicas e os métodos usados para sua produção. Dessa forma, tem-se os remixes estendidos, seletivos e reflexivos, os mashups de serviços (de dados) agregativos e integrativos e os mashups de conteúdos regressivos e não regressivos (NAVAS. 2012; BUZATO et al., 2013).

Em síntese, os remixes estendidos são versões maiores em relação à obra original, tendo faixas sampleadas acrescentadas à versão original, como é o caso de versões estendidas de músicas ou filmes. Já os remixes seletivos são versões menores das originais, com os samples retirados para encurtar o tempo de reprodução, como é o caso das versões de rádio (ou clean) de músicas, que costumam tirar versos ou estrofes para encurtar o tempo de duração destas. Os remixes reflexivos, por outro lado, não mudam apenas o tempo de reprodução da obra original, mas também sua roupagem, podendo haver mudanças significativas, mas que não comprometem a “aura espetacular” da obra original. No caso dos mashups de serviços, a modificação acontece a nível de programação, não só nas semioses como nos casos anteriores e no caso do mashup de conteúdos. Esse tipo de mashup se divide em agregativo, quando códigos fontes de diversos sites são agregados em uma única plataforma, ou integrativos, quando há a integração desses códigos, transformando-os em algo novo. Diferentemente dos mashups de serviços que fazem uso da estrutura e dos códigos fontes das obras originais, os mashups de conteúdo unem as semioses de obras diferentes para criar um efeito de sentido, não para oferecer um serviço. Nesse caso, podemos ter aqueles nos quais é possível reconhecer as obras fontes, tornando-os regressivos, e podemos ter aqueles nos quais não é possível reconhecê-las, os não regressivos.

Há também a existência daqueles enunciados que usam a técnica de remix, mas bebem de duas (ou mais) fontes, esses são chamados de mashups e se diferenciam do remix exatamente no reconhecimento de mais de uma obra original [questão do reconhecimento da aura].

O remix, portanto, pode ser definido como uma produção que usa samples de uma única obra original para criar um novo efeito de sentido, assim como pode ser a técnica utilizada ao selecionar, copiar/recortar e colar esses samples. Ainda, a cultura da remix é o ambiente no qual tais técnicas são utilizadas e dão origens a essas produções, impulsionadas pelos novos letramentos e pelo ethos no qual estão inseridos os sujeitos que produzem e consomem tais peças.


Estética do sampling

Apesar de a cultura remix ser algo que surgiu dentro do novo ethos (LENKSHEAR e KNOBEL, 2006, 2012), o ato de remixar não é algo exclusivo da Web 2.0. O termo, na verdade, surgiu na década de 1970 quando e ficou amplamente conhecida no mundo da música, sendo emprestada por outros setores das artes como o cinema e a fotografia posteriormente. Mas o ato em si é muito mais antigo do que os termos que o nomeiam, tanto samplear quanto remixar surgiram no mundo da música com a ascensão dos DJs na segunda metade do século XX. Porém, em meados do século XIX, samples do mundo real já começavam a ser tirados com o surgimento da fotografia. Em seguida, quando a tecnologia mecânica proporcionou, samples de imagens estáticas, em movimento e de áudios eram recortados e reorganizados usando ferramentas específicas. Dessa forma, até esse momento, apenas especialistas conseguiam fazer esse tipo de produção, como no caso das fotomontagens e colagens de fotos do início do séculos XX.

Mas o momento chave para o remix ocorreu nas décadas de 1960 e 1970 no mundo da música quando equipamentos de sampling tornaram mais fácil copiar trechos de músicas e com uma qualidade melhor. Os primeiros passos foram dados na Jamaica, mas foi posteriormente, nos Estados Unidos, que o remix se popularizou. Quando o Hip Hop incorporou o remix em suas produções, ele deixou de ser apenas uma técnica para se tornar um gênero musical. Mas, até esse momento, remixar ainda era restrito àquelas pessoas que tinham domínio e acesso a determinadas ferramentas mecânicas. Porém, a partir da década de 1990 e com a ascensão dos novos artefatos tecnológicos (LENKSHEAR e KNOBEL, 2006, 2012), o remix se tornou mais alcançável para pessoas comuns, pois passou a ser preciso apenas um computador com ferramentas de edição para produzir obras remixadas, surgindo, assim, a cultura remix.

Atualmente, além do remix de áudio no mundo da música, temos também a prática de remix envolvendo diferentes semioses, como a imagem estática (já presente no século passado), a imagem em movimento e até o texto vernal. Muitas vezes, produções oriundas da técnica de remixar juntas duas ou mais dessas semioses, como é o caso dos mashups em vídeo, do Political Remix Video e do Fan Vid.


Referências

ALMEIDA, E. M. Anime music video (amv), multi e novos letramentos: o remix na cultura otaku. Campinas: Unicamp, 2018.

NAVAS, E. Remix theory: the aesthetics of sampling. New York: SpringWien New York, 2012.

BUZATO, M. El K, et al. Remix, mashup, paródia e companhia: por uma taxonomia multidimensional da transtextualidade na cultura digital. RBLA, Belo Horizonte, v. 13, n. 4, p. 1191-1221. 2013.

KNOBEL, M. LENKSHAER, C. ‘New’ literacies: technologies and values. Teknokultura, 2012.

KNOBEL, M. LENKSHAER, C. New Literacies: Everyday Practices and Classroom Learning. 2ª Ed. Open University Press: Nova York, 2006.

LESSIG, L. Remix: Making Art and Commerce Thrive in the Hybrid Economy. Nova York: Bloomsbury, 2008.

MCINTOSH, J. Building a Critical Culture with Remix Video – A talk by Jonathan McIntosh. Pop Culture Detective, 31 Jul. 2011. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xwpI9yTnuBQ&feature=youtu.be&fbclid=IwAR0e8B3287ltAa15ruFiSvoVQXsx8NR54pxg9pzqemmu8h4p3HNFshNMprg>. Acesso em: 17 set. 2020.

PINHEIRO, P. FELÍCIO, R. P. Copiar-colar e remix: o que a escola tem a ver com isso?. In: Calidoscópio. Vol. 14, n. 1, p. 59-69, jan/abr 2016.


[Primeira formulação: Suzy da Costa Rocha]